Um efeito adverso potencial dos agonistas do receptor do peptídeo semelhante ao glucagon tipo 1 (GLP-1), menos discutido que outros eventos adversos, é a interferência na libido dos pacientes, que pode se manifestar como embotamento ou redução da resposta sexual.
Uma boa notícia é que o problema pode ser atenuado.
Cerca de 4% dos americanos estavam em uso de agonistas do receptor de GLP-1 para sobrepeso, obesidade ou diabetes tipo 2 em 2024, científico. Esse número mostra um aumento expressivo de 600% desde 2018, com poucos sinais de desaceleração, apesar dos efeitos gastrointestinais que alguns pacientes apresentam ao usar esses medicamentos.
Os mecanismos ativos por trás dos agonistas de GLP-1
Esses medicamentos atuam principalmente no intestino, mas também em vias cerebrais relacionadas à regulação do apetite e ao processamento de recompensas, explicou a Dra. Bronwyn Holmes, médica e membro do conselho consultivo médico da uma clínica on-line de perda de peso que prescreve agonistas de GLP-1. Segundo ela, é difícil determinar com precisão como eles funcionam, pois os mecanismos de ação ainda não são totalmente conhecidos.
Acredita-se que esses agentes atenuem os sinais de recompensa gerados pela o que ajuda a reduzir a vontade de comer e outros comportamentos compulsivos. Isso pode afetar indiretamente o humor e a motivação, o que é útil para a perda de peso, mas potencialmente relevante para outras atividades motivadas por recompensa, como intimidade ou de álcool”, destacou a médica.
Pesquisas recentes também sugerem que esses medicamentos podem aumentar a atividade de receptores de serotonina, que estão associados à inibição do desejo sexual em outros contextos.
A combinação de sinalização reduzida de dopamina e serotonina elevada pode contribuir para uma resposta de recompensa menos intensa, acrescentou a especialista. No entanto, ainda há poucos ensaios clínicos definitivos em humanos.
O médico psiquiatra Dr. Ryan S. Sultan ressaltou que uma análise mais aprofundada dos estudos atuais sobre o uso dos agonistas de GLP-1 no tratamento da dependência química destaca seus efeitos na química cerebral. Nesse sentido, ele concorda com a Dra. Bronwyn.
Nova pesquisas sugerem que essa classe pode vir a ser empregada para reduzir desejos e melhorar a recuperação em casos de em álcool e opioides, segundo o Dr. Ryan, que é professor assistente de psiquiatria clínica no Irving Medical Center, da Columbia University, e fundador e diretor clínico da Integrative Psychiatry, nos Estados Unidos.
Ele explicou que agonistas do receptor de GLP-1 podem aumentar a liberação de dopamina na via mesolímbica, elevando os níveis basais e reduzindo o pico que leva à compulsão alimentar. Outros estudos, entretanto, mostraram que a ativação do receptor pode levar à redução da dopamina e da compulsão alimentar. Nas vias da serotonina, essa ativação também auxilia na regulação do apetite.
Como a reprodução e a alimentação são impulsos inerentes ao sistema humano, o Dr. Ryan afirmou que “faz todo o sentido biológico” que ambas as necessidades estejam vinculadas às vias de recompensa do cérebro. Ele acrescentou que uma superabundância de alimentos na sociedade ocidental gera “uma grave disfunção nas vias do sistema de recompensa associadas à alimentação”.
“O sexo também se baseia no impulso e na recompensa, e muitas redes neurais envolvidas nos impulsos alimentares e sexuais se sobrepõem”, salientou.
O uso agonistas de GLP-1 essencialmente atenua os processos internos que levam às pessoas a satisfazer necessidades evolutivas. Ao inibir os caminhos relacionados à aquisição de alimentos, interfere-se também nos sistemas sobrepostos que modulam a prática sexual.
Segundo a Dra. Bronwyn, os efeitos adversos físicos que alguns pacientes experimentam, como náusea, constipação e fadiga, também podem contribuir para a redução do desejo sexual.
Lado positivo
A Dra. Bronwyn ressaltou que alguns pacientes relatam aumento do desejo sexual como resultado da perda de peso e da melhora da autopercepção, sugerindo que os agonistas de GLP-1 podem trazer benefícios para a libido em determinados casos.
“A maioria das pessoas apresenta melhora no desejo e na função sexual após a perda de peso, porque o humor melhora, assim como a autoestima e o equilíbrio hormonal”, explicou. “A redução da libido induzida por medicamentos nem sempre supera os benefícios da perda de peso, que são mais acentuados em mulheres na menopausa e homens com baixos níveis de
Flutuações hormonais
Dado que os agonistas de GLP-1 atuam nos hormônios, é natural que afetem o funcionamento geral do sistema endócrino. O mecanismo pelo qual auxiliam no controle glicêmico em pacientes com diabetes tipo 2 envolve a estimulação da liberação de insulina e a desaceleração na do além do retardo do esvaziamento gástrico.
Duas décadas após o lançamento do primeiro medicamento desta classe, pode ser difícil lembrar que a perda de peso era originalmente apenas um efeito colateral. Nesse contexto, as alterações hormonais observadas antes, durante e após o tratamento podem interagir com os efeitos dos agonistas de GLP-1 na libido.
“A perda de peso melhora a sensibilidade à insulina e diminui a resistência à leptina, o que leva a mudanças positivas nos níveis de testosterona e estrogênio em pessoas com disfunção metabólica no início (do tratamento)”, explicou a Dra. Bronwyn.
Para que profissionais de saúde compreendam quais flutuações hormonais estão ocorrendo, seria essencial dispor de dosagens basais.
“Pesquisas preliminares indicam que o uso prolongado de agonistas de GLP-1 pode levar ao aumento dos níveis de testosterona em pacientes do sexo masculino”, informou. “Pessoas que já apresentam alterações na libido relacionadas a hormônios, como mulheres na menopausa ou homens com baixos níveis de testosterona, tendem a ser mais sensíveis aos efeitos neuroquímicos desses medicamentos. Nessas situações, pequenas variações de dopamina ou serotonina tornam-se mais perceptíveis”.
No geral, mais pesquisas são necessárias sobre a interconexão entre GLP-1, hormônios e desejo sexual, afirmou a Dra. Hayley Miller, médica especialista em medicina da obesidade e diretora de saúde metabólica da Nurx, uma clínica on-line de saúde feminina.
Atenuando a diminuição da libido
Todos os especialistas ressaltaram que pacientes e médicos devem trabalhar juntos para discutir ajustes no regime de medicação em caso de alterações na libido. A Dra. Bronwyn destacou que há diversas estratégias para modificar a prescrição ou adotar medidas complementares capazes de minimizar o impacto desse efeito colateral ou de seus fatores subjacentes.
“Isso inclui ajustar a dose, tratar sintomas relacionados, como fadiga ou náusea, e oferecer suporte à saúde sexual por meio de otimização hormonal, aconselhamento ou mudanças no estilo de vida”, explicou. “Na maioria dos casos, os efeitos sobre a libido ou o humor são reversíveis após a interrupção da medicação. No entanto, o tempo e a duração da reversão variam de acordo com o indivíduo e a presença de outros fatores contribuintes.”
Fonte: Medscape

