O horário das refeições influencia a predisposição genética à obesidade

Alimentar-se cedo pode mitigar o risco genético de predisposição à obesidade e favorecer a manutenção da perda de peso em longo prazo, concluiu um estudo multicêntrico publicado no periódico Obesity. [1] Nos últimos anos, o horário das refeições surgiu como um fator relevante com impacto no controle do peso. Evidências sugerem que ele pode influenciar o metabolismo, o gasto…

Alimentar-se cedo pode mitigar o risco genético de predisposição à obesidade e favorecer a manutenção da perda de peso em longo prazo, concluiu um estudo multicêntrico publicado no periódico Obesity[1]

Nos últimos anos, o horário das refeições surgiu como um fator relevante com impacto no controle do peso. Evidências sugerem que ele pode influenciar o metabolismo, o gasto energético e os processos fisiológicos relacionados à regulação do peso corporal. Além disso, atua como um sinal de sincronização para tecidos metabólicos, como fígado, pâncreas e tecido adiposo. Portanto, uma mudança no horário das refeições pode modificar a sincronização dos relógios circadianos moleculares e, consequentemente, os ritmos da função metabólica.

“Compreender o papel do momento da ingestão de alimentos na obesidade, na eficácia da perda de peso e na manutenção da perda de peso em longo prazo, bem como sua interação com a genética, pode impulsionar o desenvolvimento de novos programas de prevenção ou intervenções comportamentais voltadas à obesidade, incluindo estratégias de nutrição de precisão”, observaram os autores na publicação.

O objetivo principal do estudo foi analisar as associações entre o momento da ingestão de alimentos e o índice de massa corporal (IMC), a eficácia da perda de peso e sua manutenção em longo prazo, além de avaliar a relação entre IMC, escores de risco poligênico para obesidade e eficácia da perda de peso, considerando também a interação entre o horários das refeições, IMC e escore de risco poligênico.

O estudo observacional, transversal e prospectivo contou com 1.195 adultos com sobrepeso ou obesidade participantes do Obesity, Nutrigenetics, Time, Mediterranean (ONTIME), conduzido em seis clínicas espanholas especializadas em perda de peso.

Todos os participantes seguiram um programa com base em educação nutricional, atividade física e técnicas comportamentais, sem controle do horário das refeições, o que lhes permitiu adotar hábitos alimentares espontâneos.

Aqueles que permaneceram vinculados ao centro clínico por mais de três anos foram contatados para avaliação do peso atual e da manutenção da perda de peso em longo prazo.

Foram calculados a porcentagem de perda de peso, a perda total de peso, a taxa de perda de peso e uma pontuação de síndrome metabólica.

No início do estudo, foram avaliadas as concentrações séricas de glicose, colesterol, triglicerídeos, lipoproteínas e leptina, além de registrados os horários do café da manhã dos participantes. Esses dados foram usados para calcular o ponto médio da ingestão alimentar, com base na primeira e na última refeição do dia, classificando os participantes como indivíduos que se alimentavam mais cedo ou mais tarde.

Por fim, foi realizada uma análise exploratória da interação de 97 variantes genéticas específicas conhecidas por estarem associadas ao IMC.

A Dra. Marta Garaulet, Ph.D. em Farmácia, do Departamento de Fisiologia da Universidad de Murcia, na Espanha, e uma das autoras do trabalho, destacou as principais dificuldades na condução da pesquisa. “Primeiro, tivemos que obter o DNA dessas pessoas para determinar 97 variantes genéticas, o que é um número elevado, e conseguir esse financiamento foi um grande desafio. Depois, contatamos pessoas que haviam participado do tratamento para perda de peso há aproximadamente 13 anos e avaliamos sua situação atual”.

Os resultados mostraram que um ponto médio mais tardio da ingestão de alimentos esteve associado a menor sucesso na manutenção da perda de peso em longo prazo. Além disso, o momento desse ponto médio interagiu com as pontuações de risco poligênico.

Um aumento no IMC de mais de 2 kg/m² por hora de atraso no horário das refeições também foi observado em indivíduos com alta relação entre IMC e escore de risco poligênico (β [EP] = 2,208 [0,502] kg/m²; p = 1,0 E-5), enquanto nenhuma associação evidente foi encontrada entre aqueles com menor risco genético.

Esses achados sugerem que realizar refeições mais cedo pode atenuar o risco poligênico de obesidade.

“Não esperávamos que a predisposição genética para o ganho de peso não estivesse associada à manutenção do peso em longo prazo. Isso significa que não estamos predeterminados a recuperar o peso com base apenas em genética. Em vez disso, nossos hábitos, como comer tarde, estão associados a esse processo e podem ser modificados”, explicou a Dra. Marta.

O Dr. Juan José González, coordenador da Unidade de Sobrepeso e Obesidade do Vithas Vigo, na Espanha, e que não participou da pesquisa, destacou que o trabalho integra os conceitos de genética e crononutrição: “Mostra como uma predisposição genética à obesidade pode ser modulada e traz uma perspectiva de aplicação clínica, ao considerar o momento da ingestão como um fator modificável e acessível. Isso permite avançar em direção a uma nutrição personalizada para diferentes predisposições, considerando não apenas o quanto ou o que comemos, mas também em que momento o fazemos”.

O especialista acrescentou que o uso de um sensor ou aplicativo de rastreamento poderia aprimorar os resultados em comparação ao método de autorrelato dos horários de refeição, além de ampliar as análises de outras variáveis que influenciam o ganho de peso. “Gostaria de ver a inclusão de aspectos como tempo de sono, estresse e até mesmo tipo de dieta, o que daria mais robustez ao estudo”.

Sobre a continuidade da pesquisa, a Dra. Marta observou que os autores pretendem avaliar os mecanismos por trás dos resultados encontrados. “Identificamos variantes genéticas específicas, como rs9925964 rs1018218, que interagem com o horário das refeições e o IMC. As pessoas que as têm são especialmente sensíveis ao efeito do horário das refeições, mas ainda não sabemos o motivo. Essa é a questão que queremos estudar agora: o que essas variantes têm em particular, como reagem ao horário das refeições e por que isso acontece.”

O projeto foi financiado pelo Ministério da Ciência, Inovação e Universidades da Espanha, pela Fundação Seneca e pelo National Institute of Diabetes and Digestive and Kidney Diseases dos Estados Unidos.

Frank A.J.L. Scheer atuou no Conselho de Administração da World Sleep Society e recebeu honorários de consultoria da University of Alabama, nos EUA, que não estão relacionados a este trabalho. Richa Saxena é cofundadora da Magnet Biomedicine, uma empresa não relacionada a esta pesquisa. A Dra. Martha Garaulet, Ph.D., e o Dr. Juan José González informaram não ter conflitos de interesses.

Fonte: Medscape

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